O que é a Medicina Veterinária do Coletivo?
Entre os dias 21 e 22 de maio de 2021 acontece a X Conferência Internacional de Medicina Veterinária do Coletivo, um evento que será online e contará com muita pesquisa, conteúdo, troca e conhecimento a partir de palestras nacionais e internacionais, com tradução simultânea do espanhol e inglês, libras e português.
Para saber mais sobre a Medicina Veterinária do Coletivo, conversamos com o médico veterinário Lucas Galdioli e o conselheiro fiscal do Instituto Medicina Veterinária do Coletivo (IMVC), Taylison Santos.
O que é a Medicina Veterinária do Coletivo?
A Medicina Veterinária do Coletivo (MVC) é uma área em ascensão da Medicina Veterinária que interliga a Saúde Coletiva, a Medicina de Abrigos e também a Medicina Veterinária Legal. O profissional que atua na MVC é um agente de saúde e transformação social. Porém, a MVC é uma área oferecida por pouquíssimas universidades brasileiras, tanto que até o presente momento só temos uma residência para profissionais que desejam se especializar nessa área. A MVC é multidisciplinar, sempre trabalhando em conjunto com setores da saúde, educação, meio ambiente e assistência social. Mantendo contato também com a polícia civil, ministério público e ONG ‘s.
Fonte: Instituto de Medicina Veterinária do Coletivo
Quais as motivações para a criação do Instituto de Medicina Veterinária do Coletivo (IMVC)?
No século XIX, com a descoberta da presença do vírus da raiva na saliva dos cães por Louis Pasteur, eles começaram a ser capturados e eliminados ao redor do mundo. Afogamento, choque elétrico, câmaras de descompressão, morte por asfixia, pauladas, envenenamento e armas de fogo eram métodos usados para eliminar esses animais. Mesmo com o passar das décadas e estando já há 20 anos no século XXI, ainda existe falta de conhecimento, de vontade técnica e de políticas públicas eficientes para um manejo adequado, eficiente e ético desses animais.
Nos Estados Unidos, nos anos 1980, surgiu o movimento No kill (Não matar), que tinha como missão garantir um lar para cães e gatos adotáveis. No Brasil, e em especial no estado de São Paulo, já em meados da década de 1990, as autoridades de saúde pública foram pressionadas pela sociedade a encontrar uma solução mais ética para a destinação de animais que viviam nas ruas, porque o controle da raiva e o não aparecimento de casos em cães e gatos, assim como em seres humanos, já era uma realidade, graças a programas de controle que intensificaram estratégias como a vacinação de animais, o acompanhamento de casos de agravos com seres humanos e o envio de amostras de animais com proto- colo sugestivo – ou seja, um implemento da vigilância em si. As ONGs (organizações não governamentais) promoviam à época discussões a respeito das alternativas para o controle ético de animais sadios e inseriam essas propostas em um conceito de valores sociais como a coletividade, a inclusão, a compaixão, visando o desenvolvimento de ações de promoção à saúde.
O ano de 2003 ficou marcado pela Reunión Latinoamericana de Expertos en Tenencia Responsable de Mascotas y Control de Poblaciones, organizada pela WSPA e pela Opas no Rio de Janeiro, RJ. Esse evento contou com a participação de alguns profissionais que no futuro se uniriam para a criar a ONG inicialmente denominada Itec, em maio de 2004.
Nesse contexto surgiu o Itec, objetivando trazer conhecimento, aprimorá-lo de acordo com a realidade e as necessidades nacionais e capacitar gestores, agentes, médicos-vete- rinários e demais profissionais envolvidos nas políticas de manejo populacional de cães e gatos nos municípios brasileiros, sempre com os mais novos conhecimentos da ciência, com atitudes e técnicas mais éticas, contrapondo- -se de forma efetiva ao que era proposto até então. A castração, o registro e a identificação, o manejo humanitário, a educação para a guarda responsável, a legislação, o controle de recursos e a criação de políticas públicas eficientes ao controle das populações de cães e gatos eram algumas das propostas do Itec.
As Conferências de Medicina Veterinária do Coletivo, organizadas pelo Itec, também foram eventos pioneiros no Brasil, trazendo discussões técnicas sobre uma área nova da medicina veterinária que surgia naquele momento e que abrange conhecimentos de bem-estar animal, medicina de abrigos (shelter medicine), medicina veterinária legal, a saúde coletiva e, mais recentemente, a medicina veterinária de desastres.
A evolução do pensamento com relação à medicina veterinária do coletivo, todo esse histórico de atuação do Itec e nosso constante desejo de mudanças e avanços têm nos levado a cada vez mais incluir novos e fundamentais conceitos, como o da Saúde Única. Nela, os animais e os seres humanos interagem de forma constante com o ambiente, e é necessário que se criem ações comuns de promoção, preservação e cuidado, lembrando que precisamos evoluir e renovar, tornando- -nos mais abrangentes, sem perder a essên- cia e a base da nossa atuação.
Dessa forma, agora o Itec se ressignifica, tornando-se o Instituto de Medicina Veterinária do Coletivo (IMVC). Continuaremos capacitando profissionais, produzindo conhecimento e práticas técnicas racionais para a melhora do ambiente e da qualidade de vida de seres humanos e animais.
FONTE: SANTOS, T; XAULIM, G; NUNES, V. O surgimento e a ressignificação do Itec, que agora será IMVC. Clínica Veterinária, Ano XXV, n. 147, julho/agosto, 2020.
Quais são as ações do IMVC? Quais as áreas e profissionais envolvidos e capacitados?
O IMVC contribui com a bagagem intelectual e prática de todos os que foram e estão envolvidos com os projetos desempenhados pela ONG, trazendo práticas intersetoriais e multiprofissionais para a construção de melhor qualidade de vida para os seres humanos, os animais e o ambiente em que todos habitam – ao passo que a evolução ética social das comunidades as desperta cada vez mais para os direitos dos animais, fortalecendo a presença da medicina veterinária na saúde pública e trazendo à luz o conceito de Saúde Única.
Atuando em prol da Saúde Única, foi criado o curso de Formação de Oficiais de Controle Animal (Foca), que capacita profissionais não só para a captura dos animais de forma correta, mas também buscando sensibilizar os participantes a serem agentes de uma transformação necessária e eficaz, e disseminadores da informação e da mudança.
O Foca é o único curso no país que faz esse tipo de capacitação e treinamento com profissionais qualificados, sendo, portanto, pioneiro no Brasil. De uma ação inicialmente nacional, já foram capacitados cerca de 4 mil profissionais em toda a América Latina e em Portugal.
Recentemente foi criada, também pelo IMVC, em parceria com a Coordenadoria Estadual de Defesa da Fauna do Ministério Público de Minas Gerais (Cedef-MPMG), a Capacitação para a Gestão do Manejo Populacional de Cães e Gatos, que está treinando gestores e profissionais envolvidos em programas e políticas públicas de 200 municípios do estado de Minas Gerais para gerirem de forma racional os recursos aplicados nos programas, buscando os melhores resultados. Além disso, no ano de 2021 foi realizada a parceria com a Universidade Federal do Paraná, para a realização do Curso de pós-graduação em Medicina Veterinária do Coletivo chancelado pelo IMVC.
O corpo técnico que compõe o IMVC conta com a participação de diversos profissionais, configurando uma equipe multidisciplinar que abarca: Médicos-Veterinários, Advogados, Gestores Financeiros, Biólogos, Administradores, Médicos, Psicólogos, e etc.
FONTE: SANTOS, T; XAULIM, G; NUNES, V. O surgimento e a ressignificação do Itec, que agora será IMVC. Clínica Veterinária, Ano XXV, n. 147, julho/agosto, 2020.
Quais serão os principais temas abordados na X Conferência Internacional de Medicina Veterinária do Coletivo?
Medicina de Abrigos: Fundamentos e práticas
9h00 – Experiência brasileira em medicina de abrigos – Dr. Lucas Galdioli, UFPR
9h20 – Experiência americana em medicina de abrigos – Dra. Simone Guerios, UFPR e Florida University
Medicina de Abrigos: Manejo Comportamental
10h10 – As bases do manejo comportamental. Dr. Nestor Calderón, IMVC.
10h30 – Experiência em programas comportamentais em abrigos. Dr. Fredy Manrique, Medellin, Colômbia
Medicina de Abrigos: Desastres
11h10 – Grupo de Resgate de Animais em Desastres (GRAD). Dra. Vania Nunes, IMVC, Fórum Animal e Prefeitura de Jundiaí́
11h30 – Experiências com a medicina de desastres. Dr. Nuno Paixão, Bombeiro, Portugal
11h50 – Projeto Resgate de Fauna Oleada. Dra. Leticia Koproski, Funespar/Ceped-PR
12h10 – Atuação da Comissão Nacional de Desastres em Massa envolvendo animais. Tenente Cláudio Zago Júnio, CBPMSP, CNDM/CFMV.
12h30 – Técnicas de resgate de grandes animais em desastres. Dr. Leonardo Maggio de Castro, UNISO.
Medicina Veterinária legal (tradução simultânea inglês-português)
14h15 –A realidade da perícia cível na medicina veterinária no Brasil. Dra. Talia Tremori, autônoma
14h45– Patologia Forense nas investigações de maus-tratos aos animais. Prof. Dr. Raimundo Tostes, UFPR
15h15 – Investigação de crimes contra a fauna doméstica e silvestre. Dr. Jason Byrd, Universidade da Flórida
Saúde Coletiva: Manejo populacional canino e felino – Mesa 1
9h00 – Avaliação e sustentabilidade de programas de MPCG. Elly Hibby, Bióloga, ICAM, Inglaterra (a confirmar)
9h40 – Brasil e as inovações no MPCG. Rosangela Ribeiro, Brasil
10h00 – Inovações latinas no MPCG. Melania Gamboa, Colômbia (palestra em espanhol)
Bloco Saúde Coletiva: Manejo populacional canino e felino – Mesa 2
Inovações no Estado de Minas Gerais: empoderando os municípios para um manejo populacional de cães e gatos efetivo
10h50 – Dra. Ana Liz Bastos – IMVC-ITEC
11h10 – Dr. Gustavo Xaulim – IMVC-ITEC
11h30 – Luciana Imaculada, Promotora, Ministério Público do Estado de Minas Gerais
Bloco Saúde Coletiva e o Médico Veterinário
13h30 Animais de estimação e o COVID-19 – Prof. Dr. Paulo Brandão – USP
14h00 Experiência em Saúde Única na Atenção Básica – Prof. Dr. Daniel Brandespim- UFRPE
14h30 Transtorno de Acumulação de Animal: experiência de um grupo técnico de MG – Profa. Dra. Danielle Magalhães – UFMG
Bloco Saúde Coletiva: Teoria do Elo
15h10 – A atuação multidisciplinar e intersetorial. Dra. Laiza Bonela, UFMG, IMVC
15h30 – Experiência no Paraná. Dra. Yasmin Gonçalves, UFPR
15h50 – Trabalhando o agressor: experiencia paulista. Dra. Luciana Vargas, autônoma.
Bloco Medicina Veterinária Social: Bem-estar do médico veterinário
16h50 – Dr. Marcio Ferracioli, Universidade Federal do Paraná
17h10 – Dr. Néstor Calderón, Universidad de La Salle, Colombia e IMVC Colombia
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Como o IMVC atua junto aos abrigos?
O IMVC tem um papel fundamental em consolidar a área de Medicina de Abrigos no Brasil, visto que é uma área pouco profissionalizada e com alta demanda pela sociedade. Uma das formas de atuação é na capacitação de colaboradores que atuam direta e indiretamente por meio de cursos, palestras e consultorias, com o objetivo de garantir melhorias nas políticas internas dos abrigos e garantir um bom nível de bem-estar dos animais abrigados, além dos trabalhadores.
É importante compreender que os abrigos são uma das estratégias de um programa de manejo populacional nos municípios, recuperando os animais abandonados e reintroduzindo-os na sociedade por meio da adoção, mas não resolvem o problema da presença deles nas ruas e nem do abandono. Os estudos da Medicina de Abrigos no Brasil foi uma demanda das mudanças das políticas públicas para o manejo populacional de cães e gatos. Visto que é uma área pouco abordada na Medicina Veterinária e que exige protocolos e manejos específicos para animais em coletivo, é extremamente necessário que pesquisas e capacitações sejam realizadas.
Dessa maneira, a nossa instituição tem como objetivo auxiliar os abrigos para uma correta gestão, planejamento e organização. Além disso, instruímos os abrigos na articulação adequada aos órgãos competentes em garantir políticas públicas voltadas aos animais para diminuir o número de animais não domiciliados, mantê-los em um bom nível de bem-estar e minimizar os riscos que possam representar para a saúde humana e de outros seres.
FONTE: GALDIOLI, L.; FERRAZ, C. P.; LIMA, L. C. F.; GARCIA, R. C. M. Medicina de abrigos – desafios e avanços no Brasil. Revista Clínica Veterinária, v. 144, p. 28-34, 2020.
O que é a medicina veterinária de desastre?
Quando acontece uma emergência ou desastre ambiental, natural ou causado pelo homem, é necessário que se dê início a uma ação multidisciplinar para prestar auxílio à comunidade e conter os danos causados à população, aos animais e ao meio ambiente.
É importante ressaltar que os médicos veterinários são essenciais para o bom funcionamento dessas ações, auxiliando de diversas formas durante e após os resgates.
Funções essas que podem ser: administrar a gestão e a logística dos resgates, realizar o atendimento clínico aos animais, seguir protocolos sanitários e de bem-estar animal para o alojamento e o manejo de abrigos, auxiliar no controle de vetores e reservatórios de zoonoses que podem ameaçar a saúde única após o ocorrido, além de também prestar apoio emocional a comunidade.
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O que é a teoria do Elo?
A identificação de um ato de crueldade animal deve ser trabalhada como um alerta vermelho, uma vez que essa prática é considerada um dos primeiros sinais de distúrbios de conduta do homem.
A correlação entre a violência contra os animais e violência interpessoal é apresentada pela “Teoria do Elo”, a qual considera as formas negativas de interação entre os humanos e animais, como comportamentos violentos, tortura e crueldade, como possíveis precursores de futura violência contra humanos.
Pesquisas científicas embasadas na “Teoria do Elo” vem corroborando a agressividade de crianças e adolescentes dirigida aos animais como um alerta de desordem no seio familiar, como violência doméstica ou negligência, ou como um sinal de que se transformarão em futuros adultos com desordens de conduta. Desta forma, os animais funcionam como sentinelas para possíveis futuros casos de violência interpessoal, muitas vezes no próprio ambiente familiar.
Cabe ao médico veterinário, um dos principais profissionais atuantes na saúde única, saber identificar os sinais recorrentes de maus-tratos aos animais e correlacioná-los com possíveis casos de violência em seus respectivos tutores, devendo encaminhá-los para uma autoridade responsável ou acionar a polícia militar através do 190 caso o tutor seja pego em flagrante. Quando há o envolvimento de violência doméstica, o profissional pode utilizar a delegacia eletrônica ou ligar para o 180.
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Quer saber mais? Vamos abordar sobre isso e muito mais na X Conferência Internacional de Medicina Veterinária do Coletivo! Não vai ficar de fora dessa, né?
As inscrições já estão abertas e podem ser feitas aqui.
Dados Fornecidos por:
Taylison Santos
Possui graduação em Tecnologia em Gestão Financeira pela Faculdade Dom Bosco – Campus Mercês; Conselheiro Fiscal do Instituto Medicina Veterinária do Coletivo (IMVC); Gerente de Campanhas Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal (FNPDA); Tem experiência na área de Saúde Coletiva e Administração, com ênfase em Administração Financeira e captação de recursos, atuação em empresas do terceiro setor. Acadêmico de Educação Física (licenciatura) pela UFPR; Atualmente pesquisa sobre a Educação Humanitária nas comunidades de risco social. taylison.s@hotmail.com
Lucas Galdioli
Possui graduação em Medicina Veterinária pela Universidade Federal do Paraná (2018), com graduação sanduíche na Universidade de Buenos Aires na Argentina (PROGRAMA MARCA MERCOSUL [MM] – 2016). Residência Multiprofissional em Medicina Veterinária do Coletivo pela Universidade Federal do Paraná (2021) e atualmente é mestrando em Ciências Veterinárias pela mesma universidade na linha de pesquisa de Saúde Única. Tem experiência na área de Medicina Veterinária, com ênfase em Medicina Veterinária do Coletivo, Saúde Única e Saúde Pública. lucasgaldioli@ufpr.br
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